Sabesp pretende se tornar a ‘Petrobras’ do saneamento
Projeto de Lei 659/2017 transforma a Companhia em holding, permitindo a atuação em território nacional e em áreas correlatas, como a gestão do lixo
São Paulo – Tramita em caráter de urgência na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) o Projeto de Lei (PL nº 659/17), que transforma a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) em holding.
O projeto reorganiza a estrutura societária da empresa, permitindo atuar em território nacional e em áreas correlatas, como tratamento e gestão de resíduos sólidos.
O projeto, encaminhado pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB), foi publicado no dia 3 de agosto, no Diário da Alesp, e já foi aprovado pela Comissão de Justiça, Finanças e Infraestrutura.
Entidades que atuam na área de limpeza urbana (Selur, Abrelpe, Selurb, Abetre, Abrelpe, ABLP) já se manifestaram contra a medida. Entidades de água e esgoto (Sintaema, Sintius, AAPS e Arsesp) também reprovam o projeto.
De acordo com a advogada empresarial, Ana Paula Caodaglio, a proposta é genérica e infrige uma série de artigos da Constituição Federal, um deles é o 173, que proíbe a exploração direta de atividade econômica pelo Estado, salvo em casos de segurança nacional ou de interesse coletivo.
Segundo Ana Paula, o setor de limpeza urbana e resíduos sólidos está consolidado no mercado há 50 anos e, por isso, torna-se inconstitucional a atuação do Estado nesse mercado. Se aprovado o PL, o controle da holding e da Sabesp continuará com o Estado.
No entando, Ana Paula diz que o texto abre brechas. “Ao mesmo tempo que o texto coloca o Estado como sócio majoritário, ele também permite acordo de acionista de natureza deliberativa.
Com isso, assuntos de obrigação do Estado, como onde investir e áreas prioritárias, passam a ser definidas pela iniciativa privada”, observa a especialista em direito empresarial.
Segundo Ana Paula, outra irregularidade do projeto é permitir que uma empresa mista (Sabesp) incorpore outra empresa mista (holding).
“É assustador a pressa com que o governo e o legislativo está tratando um projeto como este, que altera toda a estrutura da Sabesp, e a forma com que está sendo tratado, sem diálogo com a sociedade ou com as atividades que podem ser afetadas”, diz a especialista.
Segundo a advogada, o modelo previsto para a Sabesp no PL é semelhante ao da Petrobras e ao da Petroleira Venezuelana PDVSA, o que se torna ainda mais preocupante tendo em vista a força com que essas gigantes atuam no mercado, sem espaço para concorrência, e como o modelo facilita o esquema de lavagem de dinheiro, vide os escândalos que envolvem a Petrobras, lembra.
O Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto, e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema) afirma que o PL é uma “pedalada”. O Sintaema diz que “o governo não pode vender as ações da Sabesp que estão em seu poder (50,3%) e, por isso, vai criar outra empresa para transferir essas ações à iniciativa privada.”
Segundo o governo, a ideia é captar mais investimentos para ampliar o trabalho da Companhia, contando com a “expertise” da iniciativa privada. O Estadp estima arrecadar R$ 6 bilhões com a holding.
Para o deputado estadual, Estevam Galvão (DEM), aprovar o PL é de extrema urgência para a universalização do saneamento básico no Estado e País.
“O PL dá força para a Sabesp ampliar e universalizar os serviços de saneamento e capacidade para atuar em outras áreas, como no tratamento e destinação dos resíduos sólidos urbanos, um dos grandes problemas dos municípios brasileiros”, diz.
Dados da Abrelpe de 2016 mostram que 1.559 cidades ainda destinam resíduos para lixões.
O deputado estadual, Marcos Martins (PT) discorda de Galvão e define o projeto como “irracional”.
“A Sabesp não conseguiu nem cumprir com seu papel de universalizar o saneamento para o Estado, prometido diversas vezes e, agora, com prazo para até 2021, quanto mais ter competência para atuar nacionalmente e em outras áreas”, diz. Dos 645 municípios paulistas, a Sabesp atua em 367.
Setor prejudicado
De acordo com o presidente do Sindicato das Empresas de Limpeza Urbana do Estado de São Paulo (Selur), Marcio Mateus, todo um setor já estruturado será quebrado se o PL for aprovado Só no Estado de São Paulo, são cerca de 126 empresas que prestam serviços de limpeza.
No Brasil, estima-se um total de 400, que empregam 250 mil funcionários e geram uma economia anual de R$ 27 bilhões.
“Não temos condições de concorrer com o Estado, eles possuem uma série de privilégios com isenção de tributos e são donos das licenças ambientais para instalação de aterros, que muitas vezes são dificultados para as empresas de limpeza.
Agora, o Estado que é dono das licenças, vai controlar o serviço. É uma disputa desleal”, diz.
Segundo Mateus, a coleta e destinação adequada dos resíduos pode ser resolvida com arrecadação tributária, iniciativa que tem demonstrado bons resultados.
“Lixo é uma questão municipal, o Estado não tem o direito de intervir”, aponta Mateus.
Um levantamento da PwC mostra que a destinação correta com arrecadação específica (cobrado no boleto do IPTU, água/luz ou em um específico) aumenta em 71% em 1.317 cidades do Brasil que adotam a prática.
Fonte: DCI link
Ótima matéria com uma excelente análise jurídica que dra Ana Paula Caodaglio faz, evidenciando de maneira clara as várias consequências negativas que este Projeto de Lei trará para diversos setores do País. Com certeza essa análise servirá de alerta e contribuira para evitar que esse Projeto de Lei obtenha êxito no cenário social e político fragilizando mais ainda o setor econômico que se já se encontra em um momento bem estagnado.